Construção poética em Octavio Paz

Raquel de Castro dos Santos

 

         A linguagem poética em Octavio Paz decorre dos signos em rotação, além das significações históricas e das projeções sociais do homem. Vai de encontro à linguagem como sistema de signos fundamentados no homem enquanto ser dotado de linguagem.

         Ser indagador de palavras é ser indagador do mundo, já que através das relações estabelecidas no plano das palavras se forma o mundo, ao menos a cultura, a história, a relação social, a política de um povo. Esse poder questionador presente na linguagem poética de Paz impulsiona-se à frente do branco do papel e do mundo. 

 

1 DIÁLOGO

         Vigencia a construção. São os traços acoplados num continuo finito infinitamente. Precisão. Toque profundo no simples branco negro. Profusão. Aparecem. Ressurgem. Adormecem. Latejam. Palavras. Chega o raio do sol.  A imensidão do mar. A aridez da terra. Imagens. A junção se fez perfeita sob o espaço articulado. Linguagem. Há duas vozes. A que fala e a que escuta. Nem por isso deixa de ser uma: a poética.

         A prevalência do dialogo como matéria inerente à poesia (antagonista à matéria prosaica) é latente no fazer poético de Octavio Paz. Saber que, segundo Heidegger, “nosotros los hombres somos palabra-en-dialogo”[1] nos imputa tornar a palavra comum para que haja compreensão. Para Paz a palavra é uma comunhão. É uma troca ambivalente e sem margem definida:

 

         O trovão verde

                           Amadurece

         Na folhagem do céu

                                         Estás nua

         Como uma sílaba

                                     Como uma chama  

         Uma ilha de chamas

         Paixão de brasa compassiva

         O mundo

                        Feixe de tuas imagens

         Afogadas em música

                                     Teu corpo

         Derramado em meu corpo

                                                   Visto

         Esvaído

                      Dá realidade à visão.[2]

 

         De algum modo, na poesia e no amor, o homem tem sua plenitude na alteridade (“otredad”). Como a mulher que se parte em linguagem, o homem também se parte em sua alteridade, tornando-se parte dela e da linguagem. Há a fusão entre mundo, mulher, homem e poema que se desvanecem na realidade da mirada. Esta mirada é alcançada pelo poema porque se torna real. Não possui tempo final nem começo, mas vigencia seu tempo próprio e seu espaço único. Em palavras de Guilhermo Sucre:

 

así como el mundo se condensa en la mirada que lo mira, el poema se condensa en el acto que lo propicia. Pero el acto de escribirlo no vale sino por el acto de leerlo: llamando el lector para que haga decir el poema. De ahí el título (Blanco): es un texto en blanco (como el mundo), está y no está escrito, en él la palabra está y no está dicha.[3]

 

 

O poema se cria pelo diálogo. Necessariamente, o diálogo constitui o poema. Em próprias palavras de Paz “como todo movimento do homem, o amor é um ‘ir ao encontro’”, bem como é a busca pelo diálogo, pela voz outra:

 

Entre a revolução e a religião, a poesia é a outra voz. Sua voz é outra porque é a voz das paixões e das visões; é de outro mundo e é deste mundo, é antiga e é de hoje mesmo, antiguidade sem datas. Poesia herética e cismática, poesia inocente e perversa, límpida e viscosa, aérea e subterrânea, poesia da capela e do bar da esquina, poesia ao alcance da mão e sempre de um mais além que está aqui mesmo. Todos os poetas, nesses momentos longos ou curtos, repetidos ou isolados, em que são realmente poetas, ouvem a voz outra. É sua e é alheia, é de ninguém e é de todos.[4]

 

         Longe de um monólogo, a poesia de Paz é um diálogo, um eu e tu permanente.  Nesta disposição chega-se à união no diálogo do crítico e poeta em seus ensaios e poemas. Exaurida a relação indivíduo e meio social, homem e meio histórico, Paz candencia o diálogo como força instauradora. O voltar-se a algo predica ver o outro. Nesse obrar mantém-se o diálogo e a unidade:

              

Somos un diálogo, y quiere decir: podemos los unos oír de los otros. Somos un diálogo, y esto viene a significar además: somos siempre un diálogo. La unidad del diálogo consiste, por otra parte, en que la Palabra esencial se hace patente lo Uno y lo mismo en que nos unificamos, sobre lo que fundamos la unanimidad, lo que nos hace propiamente uno mismo. El diálogo y su unidad soporta nuestra realidad de verdad.[5]

 

               Pela convenção pré-estabelecida a linguagem se impregna de história, mas, ao absorvê-la a ultrapassa, na poética, pela oposição ao signo dado, ao dizível estabelecido. Para Paz “o dizer poético diz o indizível”. Conseqüentemente, “a poesia é ‘consagração do instante, de um momento histórico concreto, mas ao mesmo tempo de uma liberdade individual, de um absoluto...  A criação poética é ato de liberdade individual condicionada a um presente histórico”.[6] O ser histórico e o poético se opõem conforme se complementam. Esta disposição se reflete no poema “Madrugada”:

 

               Rápidas manos frias

                     retiran una a una

                     las vendas de la sombra

                     Abro los ojos

                                            Todavía

                     estoy vivo

                                      en el centro

                     de una herida todavía fresca.[7]

 

               No entanto, o diálogo não é somente o da semelhança, mas também, o da diferença. A presença dos contrários instaura uma unidade destoante em sinfonia, distante do projeto histórico, porém partido dele:

 

Esse estado de que fala Breton, em que ‘a vida e a morte, o real e o imaginário, o passado e o futuro, o comunicável e o incomunicável, o alto e o baixo cessam de ser percebidos contraditoriamente’, não se chama vida eterna, nem está além, fora do tempo. É tempo e está aqui. É o homem lançado para ser todos os opostos que o constituem. E o homem pode chegar a ser todos eles porque ao nascer já os traz em si, já é eles. Ao ser ele mesmo, é outro. Outros. Manifestá-los, realizá-los, é a tarefa do homem e do poeta. A poesia não nos dá a vida eterna, mas nos faz vislumbrar aquilo que Nietzsche chamava de ‘a incomparável vivacidade da vida’.[8]  

 

               O falar para a outra voz de Octavio Paz possui ligação com o falar em prol de outro de Paul Celan. Para ambos o diálogo configura o poema através da busca pelo o que não está mas pode vir a estar enquanto presença:

 

               Veio, veio. Em lugar algum

                                                               perguntam

                    Sou eu, eu

                    estava entre vocês, estava

                    aberto, estava

                    audível, fiz sinal, sua respiração

                    obedeceu, sou

                    eu ainda, vocês

                    estão dormindo.[9]

 

               Ser mesmo e outro, o estar do homem em sua “incomparável vivacidade da vida” finaliza-se em um fragmento de um poema de Hölderlin:

 

               Lleno de méritos está el hombre;

                    Mas no por ellos, por la poesía

                    Hace de esta tiena ser morada.[10]

 

2 – A VOZ

 

               Um som antes. Em seguida outro. Depois outro. E mais outro. De repente havia uma sinfonia que alardeava aos quatros cantos vozes diferentes, entretanto, iguais.

               O peso da voz é grande. Nela cabe a humanidade. E sem ela haveria um abismo fulcral profundo. Paz considera que:

 

El poema, ser de palabras, va más allá de palabras y la historia no agota el sentido del poema, pero el poema no tendría sentido – y ni siquiera existencia – sin la história, sin la comunidad que lo alimenta ya la que alimenta. [11]

 

               Em Heidegger temos que “poesía es lenguaje primogénito de un pueblo”[12]. O fundamento da linguagem está paralelo ao da poesia: Ambos são elementos criadores  por excelência. No poema há a busca de significados de objetos relativos e históricos. Também, possibilita que as palavras ultrapassem seus próprios limites. O poeta, segundo Paz, atribui às palavras um poder poético que possui um sentido histórico, já que a comunidade torna o poema possível, mas, não o esgota posto que o poema encontra-se além das palavras cotidianizadas:

Como toda creación humana, el poema es un producto histórico, hijo de un tiempo y un lugar; pero también es algo que trasciende lo histórico y se sitúa en un  tiempo anterior a toda historia, en el principio del principio. [13]

 

               O vestígio histórico no poema assegura a intercalação entre passado, presente e futuro em um contínuo temporal,

 

El poema es tiempo arquetípico [...] es tiempo que encarna en la experiencia de un pueblo, un grupo o una secta. Esta posibilidad encarnar entre los hombres lo hace manantial, fuente: el poema da de beber el agua de un perpetuo presente que es, asimismo, el más remoto pasado y el futuro más inmediato. La segunda manera de ser histórico del poema es ... su transmutar el tiempo sin abstraerlo; y esa misma operación lo lleva, para cumplirse plenamente, a regresar al tiempo.[14]

 

               Dessa forma, no poema temos “daqueles lodos sou pó”. Segundo Mário Faustino, em Poesia-experiência, a poesia possui como meta o “universal”, “deve procurar reunir os homens e identificá-los ao universo social e cósmico”, deve chegar à totalidade, enfim. T.S.Eliot, nos Ensaios de doutrina crítica, indica a tradição como elemento configurador da obra de arte, pois, “nenhum poeta, nenhum artista de qualquer arte, detém sozinho, o seu completo significado”. Nesse caso a tradição adquire um valor fundador enquanto manifestação poética de um tempo histórico a-temporal, onde convergem os poetas do passado, do presente e do futuro.

               A voz poética referencia um povo. Em “Comentários a la esencia de la poesia”, García Bacca nomeia o povo como:

 

una colectividad de hombres que han conseguido poblar todo, hasta la tierra, sus ríos, montañas, cuevas, bosques, picos, árboles [...]; de leyendas, historias, mitos, apariciones, fantasmas, poemas, música, religión [...] Todo a un tono. Ese tono único es el que hará que las voces individuales suenen concertadas. [15]

 

               A palavra poética precisa de seu povo, tal como afirma Heidegger: “la palabra poética no es sino la explicación de la voz del Pueblo”. Para Paz, a poesia também é recordação. A poesia rememora o povo. A partir do silêncio, da palavra em branco, a palavra poética nasce e se reitera à criação. Portanto, “la voz del pueblo no habla nunca en Filosofía, en Ciencia, en Religión. Habla de todo ello en Poesía, en Azul[...]”[16].

               Borges, em “A poesia”, cita Bradley que confere à poesia o efeito de “recordar algo esquecido” e não de “descobrir algo novo”. De que outra maneira algo seria recordado se não por intermédio de um povo que, assim como o poeta, descobre e inventa sua trajetória enquanto voz? Para Paz,

 

           La experiencia poética no es otra cosa que revelación de la condición humana, esto es, de ese trascenderse sin cesar en el que reside precisamente su libertad esencial.

           Si la libertad es movimiento del ser, trascenderse continuo del hombre, ese movimiento deberá estar referido siempre a algo. Y así es: es un apuntar hacia un valor o una experiencia determinada[...] Nos habla del poema mismo, del actor de crear y nombrar. Y más: nos lleva a repetir, a recrear su poema, a nombrar aquello que nombra, y al hacerlo, nos revela lo que somos [...] al recrear sus palabras, nosotros también revivimos su aventura y ejercitamos esa libertad en la que se manifiesta nuestra condición.[17]

 

                    A idéia de Paz de mundo como texto, abordada em crítica de Uchôa Leite, nos remete à idéia de mundo como um texto a ser decifrado, a ser decodificado. Essa relação se torna possível pela convenção de signos adotados por um povo, e, pela capacidade de transcendê-los. Ao mesmo instante que se remete a sua função histórica, a palavra se vincula ao seu branco, aquilo que está à espera de decifração. Como ponto finalizador temos a seguinte afirmação de Paz: “A poesia é a memória feita imagem e esta convertida em voz”.

 

3 LINGUAGEM E IMAGEM

               Luzes traspassam o cômodo frio. Figuras surgem andando no chão escuro. Passos enchem de som o ambiente devastado. Cores dão vida a objetos enlanguescidos. Jorra o tempo despercebido na habitação intacta. Noite. A escuridão avassala irrompendo no espaço o imóvel. Estaticidade. 

               A revelação nos causa assombro. O estranhamento nos retira do fluxo simplório espaço-temporal, deixando irromper uma outra realidade não percebida anteriormente. A constatação do outro causa espanto.  Fala-nos Paz

 

o homem é um ser que se assombra: ao se assombrar, poetiza, ama, diviniza. No amor há assombro, poetização, divinização e fetichismo. O poetizar também brota do assombro, e o poeta diviniza com o místico e ama como o enamorado.[18]

 

                    A linguagem se revela imprescindível na concepção do real, mas não o detém. É o que nos apresenta Carneiro Leão, em “A poesia e a linguagem”, no dialogo de Hölderlin e Saussure:

 

        Falar a partir da Linguagem da poesia não é indicar uma outra linguagem dentro ou fora da estrutura de língua e discurso. Pois assim operando, já de-finimos a Linguagem como um objeto dentro ou fora de outro objeto, já de-finimos o dentro e o fora juntamente com sua indicação, como função de um objeto para com outro objeto. Ora, definir como objeto ou de-finir como função entre objetos, é a objetivação própria da representação. Sem dúvida desta mecânica não podemos prescindir. Mesmo quando falamos do mistério do homem, sempre operamos com signos e funções tais que vita e vital, pessoa e pessoal, vivência e vivencial, existência e existencial, estrutura e estrutural etc. [19]

 

               Portanto, a linguagem poética não se dá por mecanização de símbolos, porém, traz da palavra o sentido (poético) não previsto em um sistema. A linguagem configura o real, apesar de inutilizar parâmetros para a realidade. A prática lógica está desconectada da poética. A construção, longe de segmentar-se, surge de “impulso”, silêncio e palavra . Assim, a analogia é utilizada por Paz. Ele apresenta seu conceito poético através de analogias. O que seria refutável, sem sua própria concepção analógica unificante:

 

Há um porto em que isto e aquilo, pedras e plumas se fundem. E nesse momento não está antes, nem depois, no principio ou no fim dos tempos. Não é paraíso natal ou pré-natal céu supraterreno. Não vive no reino da sucessão, que é precisamente o dos contrários relativos, mas está a cada momento. É cada momento. É o próprio tempo engendrando-se, fluindo-se, abrindo-se a um acabar que é um contínuo começar. Jorro, fonte. Assim, no próprio seio do existir – ou melhor, do existindo-se -, pedras e plumas, o leve e o pesado, nascer-se e morrer-se, ser-se, são uma e mesma coisa.[20]

 

                   

                             Para Edgar Alan Poe os elementos rítmicos são importantes para a construção do poema enquanto instância inaugural. Bem como em Paz, o poema se configura sob um encadeamento rítmico, sonoro. O som acompanha um sentido. A sonoridade, o ritmo das palavras provoca-nos afeição diferente de acordo com o que venham a designar. As palavras, além de carregarem em si seu silêncio, seu vir a ser, levam consigo sua sonoridade que as define, ou seja, não é a funcionalidade, além do sentido despertado e latente. Tendo em vista o dizer poético e postura crítica de Paz, Uchôa coloca o ritmo e a analogia como “faces da mesma moeda”.

               À realidade histórica que se opõe ao poema, concomitantemente, à oposição do histórico ao poema, Paz em “La consagración del instante” diz o seguinte:

                   

la palabra poética jamás es completamente de este mundo: siempre nos lleva más allá, a otras tierras, a otros cielos, a otras verdades. La poesía parece escapar a la ley da gravedad de la historia porque nunca su palabra es enteramente histórica. Nunca la imagen quiere decir esto y aquello. Más bien sucede lo contrario, según se ha visto: la imagen dice esto y aquello al mismo tiempo. Y aun: esto es aquello.[21]

 

                Paz procura o processo de desautomatização da linguagem através da imagem. O espaço poético (poema) é o lugar onde a linguagem se desarticula, ou seja, faz-se imagem.  Desse modo, em Carneiro Leão, temos que:

 

O essencial é o que o poeta deixa de fazer com a Linguagem e faz com o que se fez e se faz com a linguagem. O que se fez e se faz com a Linguagem são as estrutura que o lingüista analisa. O que o poeta faz é romper as estruturas, e o que deixa de fazer é permitir que a Linguagem, deixando de ser apenas língua e discurso, venha a ser Linguagem, na poesia. Na analise química a cor não é cor. É química. A química não deixa a cor ser cor.  Só na pintura a cor vem a ser cor. Pois pintar é deixar que a cor deixe de ser tinta e venha a ser cor na obra. O lingüista é o químico, o poeta é o pintor da Linguagem.[22]

 

               O silêncio é imagem, espaço em branco. É possibilidade de linguagem. É a outra face. A poesia para Paz é “o reverso da linguagem no sentido de que é linguagem voltada sobre si e que se devora e anula para que apareça o outro, o sem medida, o embasamento vertiginoso, o fundamento abismal da medida”[23]. Mas também, “a poesia coloca o homem fora de si e simultaneamente o faz regressar ao seu original: volta-o para si. O homem é sua imagem: ele mesmo e aquele outro”. Desta afirmação acrescenta-se o paralelismo de Novalis de “homem-metáfora”. Pois, o homem sendo metáfora pode se fazer outro, posto que “a imagem não explica: convida-nos a recriá-la e literalmente a revê-la [...] E o próprio, desenraizado desde ao nascer, reconcilia-se consigo quando se faz imagem, quando se faz outro”[24]. A imagem também é estatizante.  Como mostra Ossip Mandelstam sobre Dante: “a metáfora imagem de Dante significa uma suspensão do tempo”. Desse processo, Paz entende que “a imagem reproduz o momento de percepção e força o leitor a suscitar dentro de si o objeto um dia percebido”.

               O silêncio na poesia não é o que cala, mas aquele que silencia para dizer. Afortunadamente, segundo Carneiro Leão

 

na clareira da objetividade, toda ausência é sempre ausência de alguma coisa, de um objeto. Ora, a Linguagem poética, enquanto o vigor da ausência, enquanto nos presenteia com a presença da ausência, é somente abertura da espera de nada. O poetar do poeta se concentra e recolhe na pura liberdade da espera do nada. [...] a Linguagem vige e vigora aqui neste mistério do silencio que, enquanto se retrai como presença, nos presenteia com a estrutura de língua e discurso.[25]

 

               A palavra poética parte do silêncio absoluto para chegar a sua plenitude, ou seja, a suas possibilidades que são e permitem que o homem seja, não o silêncio, mas possibilidade de existência, tão como o são as palavras:

 

               o começo

                                      o cimento

               a semente

                                     latente

                    a palavra na ponta da língua

                    inaudita                 inaudível

                                        ímpar

                    grávida                  nula

                                    sem idade

                    a enterrada de olhos abertos

                    inocente                  promíscua

                                    a palavra

                    sem nome               sem fala.[26]

 

               Através da linguagem a realidade é homologada. Desta percepção Octavio Paz, poeta e crítico da palavra, arquiteta seu universo da linguagem poética.

               Da mesma forma que o corpo é real enquanto presença, a linguagem, em Paz adquire a mesma conotação: se torna real enquanto presença. Para tal, a palavra é imagem, traz um sentido à sua pronunciação e, por analogia, mantém-se perceptível.

               O sistema arbitrário das palavras proporcionado pela arbitrariedade do mundo (ou o movimento inverso) inscreve a experiência indivíduo-temporal. Do mesmo modo que o poeta reflete-se no poema, o leitor pode ver-se no reflexo das “águas límpidas”. O ato poético para Paz inexiste como um achado, mas se dilucida pela vivência.

               Finalmente, de acordo com Octavio Paz, a construção poética torna-se vigência no  e pelo homem:

 

               Não penso, vejo

                                     – Não o que vejo,

                    Reflexos, pensamentos vejo

                    A musica, precipitações,

                    O mundo cristalizado.

                    Um arquipélago de signos.

                    Aerofania, 

                                      Boca de verdades,

                    Claridade anulada numa sílaba

                    Diáfana qual silêncio:

                    Não penso, vejo

– Não o que penso,

                    o rosto em branco do olvido,

               o resplendor do vazio.

                    Perco minha sombra,

                                                         Avanço [...]

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

SUCRE, Guillermo. “La fijeza y el vertigo”. In: Revista Iberoamericana. No  74. Enero-marzo de 1971. Vol. XXXVII. pp. 47-72.

 

BORGES, José Luis.  “A poesia”.  In: Obras Completas Sete Noites.  V.3.  Rio de Janeiro: Globo, 1999.

 

CARNEIRO LEÃO, Emanuel.  “A poesia e a linguagem”.  In: Aprendendo a pensar.  São Paulo: Vozes, 1992.

 

CELAN, Paul.  “Stretto”.  In: CristalSão Paulo: Iluminuras, 1999.

 

ELIOT, T.S. “A tradição e o talento individual”.  In: Ensaios de doutrina crítica.  Lisboa: Guimarães Editores, 1997.

 

FAUSTINO, Mário.  Poesia-Experiência.  São Paulo: Perspectiva, 1977.

 

HEIDEGGER, Martin.  Hölderlin y la esencia de la poesia.  Trad. de Juan David García Bacca.  Barcelona: Anthropos, 1994.   

 

PAZ, Octavio.  El arco y la lira.  México: Fondo de Cultura Económica, 1990.

 

------. O arco e a lira. Trad. Olga Savary. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982. (Coleção Logos)

 

------. Transblanco. Trad. Haroldo de Campos.  Rio de Janeiro: Guanabara, 1986.

                                     

NOVALIS.  Polen.  São Paulo: Iluminuras, 1989.

 

UCHÔA LEITE, Sebastião.  Crítica clandestina.  São Paulo: Taurus, 1986.

 

 

 

 

 


 

[1] HEIDEGGER, Martin. Hölderein y la esencia de la poesía. Trad. de Juan David García Bacca. Barcelona: Anthropos, 1994.

 

[2] PAZ, Octavio. Tlansblanco. Trad. Haroldo de Campos. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986.

[3] SUCRE, Guillermo. “La fijeza y el vertigo”. In: Revista Iberoamericana. No  74. Enero-marzo de 1971. Vol. XXXVII.  p.72

[4] PAZ, Otavio. O arco e a lira. Trad. Olga Savary. Rio de Janeiro, 1982. (Coleção Logos). p. 140.

[5] HEIDEGGER, op. cit., p.26

[6] UCHÔA LEITE, Sebastião. “Octavio Paz: o mundo como texto”. Crítica clandestina. São Paulo: Taurus, 1986.

[7] SAVARY, Olga. 23 poemas de Octavio Paz. São Paulo: Roswitha Kempf, 1983.

[8] PAZ, 1982:189.

[9] CELAN,Paul. “Stretto”. Cristal. São Paulo: Iluminuras. p.189

[10]Apud:  HEIDEGGER, Martin.  Hölderlin y la esencia de la poesia.  Trad. de Juan David García Bacca.  Barcelona: Anthropos, 1994. p. 88

[11] PAZ, 1990:185

[12] HEIDEGGER, op. cit., p. 32

[13] PAZ, 1990:187

[14] Ibidem, p.188

[15] HEIDEGGER, op.cit., p.78

[16] HEIDEGGER, op.cit., p. 83

[17] PAZ, 1990:191

[18] PAZ, 1982:172

[19] CARNEIRO LEÃO, Emanuel.  “A poesia e a linguagem”.  In: Aprendendo a pensar.  São Paulo: Vozes.

[20] PAZ, 1982:125

[21] PAZ, 1990:190

[22] CARNEIRO LEÃO, op. cit., p.174

[23] Ibidem, p. 128

[24] Ibidem, p. 138

[25] CARNEIRO LEÃO, op.cit.,p.180

[26] PAZ, 1986

 

 

voltar