A paisagem n’Os Sertões de Euclides da Cunha

Lucia Ricotta[1]

 

A descrição do cenário natural na parte estritamente relacionada à “A Terra” apresenta dois traços bem marcantes. Refiro-me a dois tipos dominantes de paisagem configurados no interior da escrita euclidiana, que, por contrastarem nos seus respectivos caracteres, balizam um ao outro de forma a obstar a emergência de uma terceira paisagem. Se a opção euclidiana pelo descritivismo científico indicava a crença no potencial de captação objetiva do olhar, conforme iremos avançando na leitura desta parte, seremos capazes de verificar que as características da natureza naquele cenário vão resistir de maneira particular à neutralidade exigida pela objetivação do mundo visível. Sublinhar, aqui, o elemento de resistência significa desde já chamar a atenção para uma tensão entre o controle do propósito científico euclidiano sobre a natureza e o realce do elemento dramático na paisagem. Tensão, portanto, que se traduzirá no embate do que se espera pela busca de neutralidade descritiva com a sensibilização despertada a partir do contato íntimo com a natureza. É dominantemente sob esse tensionamento que a narrativa da primeira parte d’Os Sertões se desenvolverá.

Entretanto, a incompatibilidade gerada por essa tensão abre espaço para a introdução de um outro elemento. Este, por sua vez, se afigura a um “estranho território”. Espécie de “hiato” por meio do qual o poder de reprodução fixa das linhas descritivas é esvaziado e para o qual a evocação de uma sensibilidade apurada é exigida. Foi com extrema acuidade que Luiz Costa Lima captou o caráter submerso da construção narrativa d’Os Sertões, indicando, no confronto entre pré-disposição teórico-mítica e ornamentação da linguagem, o trabalho subterrâneo da “máquina da mimesis”, segundo Costa Lima, de disparar fluxos de imagens não conectados e integrados à discursividade nem ao arcabouço especulativo do autor. O crítico, preocupado em explorar o afloramento de um “tipo de objeto insubmisso ao propósito descritivo”, detecta, no que ele chama de “ilhas da subcena” deste livro, uma elaboração imagética que se apura na ausência de conhecido, inteligência e palavras para expressá-las.

Tentando retomar a base argumentativa desenvolvida em Terra Ignota: A Construção n’Os Sertões, voltemos nossos esforços para caracterizar o retrato das paisagens atravessadas e vencidas pelo narrador em passagens da obra. Logo no início de “A Terra” observa-se a figuração de dois planos decisivos para a exploração desse cenário.

 

“O Planalto Central do Brasil desce, nos litorais do Sul, em escarpas inteiras, altas e abruptas. Assoberba os mares; e desata-se em chapadões nivelados pelos visos das cordilheiras marítimas, distendidas do Rio Grande a Minas. Mas ao derivar para as terras setentrionais diminui gradualmente de altitude, ao mesmo tempo que descamba para a costa oriental em andares, ou repetidos socalcos, que o despem da primitiva grandeza afastando-o consideravelmente para o interior”[2].

 

A altura das “altas e abruptas” escarpas do Sul e o descambar gradual de altitude rumo ao norte dão as condições necessárias para que se formem, diversamente, dois anteparos básicos para o ajuste do olhar de Euclides. As montanhas altas, de um lado, e as encostas socalcadas, de outro, possibilitam duas fontes focais: vista aérea e vista pontual. Essa dupla focalização não é fruto do vislumbre de um contemplador com as imagens avistadas, ela antes faz parte de todo um sistema ótico amparado por saber específico, a geomorfologia. É ela, portanto, que empresta sentido aos quadros naturais que se insinuam com a crescente diminuição de “primitiva grandeza” em direção ao norte do país. Servindo de contraponto à grandeza abrigada da região central do país, o cenário natural da Bahia vai sendo fisionomicamente preparado de maneira a não excluir o primeiro, senão que contribuir para a perpetuidade de seus elementos. É sob o duplo aspecto de alto-baixo e inteireza-“repetidos socalcos” que essa primeira visão litorânea pode ser captada. Vejamos como se dará a partida do planalto para a infiltração nas “terras setentrionais”:

 

“... quem o contorna, seguindo para o norte, observa notáveis mudanças de relevos: a princípio o traço contínuo e dominante das montanhas, precipitando-o, com destaque saliente, sobre a linha projetante das praias; depois, no segmento de orla marítima entre o Rio de Janeiro e o Espírito Santo, um aparelho litoral revolto, feito da envergadura desarticulada das serras, riçado de cumeadas e corroídos de angras, e escancelando-se em baías, repartindo-se em ilhas, e desagregando-se em recifes desnudos, à maneira de escombros do conflito secular que ali se trava entre os mares e a terra...”[3]

 

Nas passagens expostas, as montanhas que assoberbam os mares garantem àquele planalto inteireza, estabilidade e altura. De modo que o narrador, ao dirigir seu olhar perspectivo a partir desse planalto central, incorpora certo modo de ver a paisagem. À descida do terreno interpõe-se uma vista negativa, em que as asperezas da superfície terrestre vão ser continuamente exaltadas em função de sua força desagregadora. Assim, ao derivar para as “terras sententrionais”, em movimento que acompanha o rebaixamento geológico, ele irá encontrar fragmentos de “repetidos socalcos” despidos da “primitiva grandeza” dos “chapadões nivelados” que, para Euclides, representavam obstáculos naturais à formação de um quadro ameno, belo como o do Planalto Central. O outro trecho descartado (correpondente ao segundo parágrafo de “A Terra”) concretiza o que já se alinhavava na primeira descrição. Deixando o planalto, contornando-o, o narrador-viajante começa a deixar o terreno de largas montanhas e a vista deslumbrada — mas equilibradora — em direção ao litoral. Ali a mudança começa a se operar, da altivez ao esfacelamento progressivo.

O espaço territorial entre o Rio de Janeiro e o Espírito Santo tinha dimensão temporal, aglutinava o tempo. Se o tempo das montanhas resgatava de alguma forma o tempo primitivo, originário e perpétuo da grandeza; intacto, imóvel, sem indício de destruição; ele era um tempo mítico, no litoral, diversa temporalidade se precipitava. Lá se encontravam os terrenos de algum modo habitado, seja pelas serra desarticuladas e pelos “recifes desnudos”, seja pelos escombros. Escombros, vestígios de uma luta, um “conflito secular” entre os mares e a terra. Pela maneira como Euclides descrevia — longe da neutralidade descritiva — os elementos desse conflito parecem conter traços humanos, parecem ter as coordenadas de espaço-tempo definidas na forma particular que ali a natureza adquiriu. A revolta do relevo litorâneo, sua “envergadura desarticulada”, seu aspecto riço e corroído, a repartição das ilhas, a desagregação dos recifes, a presença de escombros — e a aparência geral de vestígio —, tudo isso lembra, faz recordar a ação destruidora do homem no tempo, do homem que não se irmana à natureza, mas que, ligado à história, se põe em conflito com o cenário natural[4]. É assim que Euclides contrastava o drama do humano, nessa torrente caótica do tempo, à idealização de paisagens naturais cuja evocação fazia sentir a satisfação provocada pela bela composição paisagística.[5]

 

Resta saber se as marcas destrutivas do tempo na natureza litorânea eram tão definitivas, a ponto de não poderem ser restituídas, isto é, voltarem a ser intactas. Resta ainda investigar se o terreno do planalto central não vai ser também despido de sua “primitiva grandeza”, através de sua inserção na dinâmica da história. Para isso devemos ter em mente o movimento que derivou não só uma troca no modo de ver, mas também uma mudança no conteúdo da paisagem. O decisivo, portanto, vai ser a observação sobre a mudança notável nas formas dos relevos: o “traço contínuo” das montanhas fora substituído pelo “aparelho litoral revolto”, “riçado”, “corroído” em sua forma de vestígio, de ruína.

Antes de respondermos a estas indagações, continuemos na trilha percorrida pelo olhar de Euclides. Seguindo somos levados a considerar os contornos oferecidos pela bacia do São Francisco. Para o autor, essa seria uma terceira paisagem, no entanto, como, a nosso ver, ela é correlata àquela do planalto central — pois seus caracteres não afrontam o quadro natural dos “chapadões nivelados” — está impedida, em nossa análise, de configurar um terceiro tipo paisagístico. Devido ao realce das características físicas da natureza e seu maior ou menor aspecto de suavidade — de arredondamento da natureza na sua formação primitiva — e seu aspecto de corrosão, de progressivo esfacelamento, veremos se formar dois topos: o da suavização e o da corrosão. O delinear de uma outra região é engendrado a partir desse investir tópico:

 

“(...) transposto o 15º paralelo, a atenuação de todos os acidentes — serranias que se arredondam e suavizam as linhas dos taludes, fracionadas em morros de encostas indistintas no horizonte que se amplia; até que, em plena faixa costeira da Bahia, o olhar, livre dos anteparos de serras que lá o repulsam e abreviam, se dilata em cheio para o ocidente, mergulhando no âmago da terra amplíssima lentamente emergindo num ondear longínquo de chapadas...”[6]

 

Congruente com os aspectos da primeira paisagem, essa descrição testemunha o topos da “atenuação”. Como no litoral não havia meios de encontrar os preceitos da “primitiva grandeza” e originária, recomendada pelas ciências da natureza, era necessário reequipar o olhar para buscar de novo formas de estabilidade e harmonia do belo. Munido do saber científico, Euclides lutava para diminuir o impacto e a dramaticidade despertados pela segunda paisagem natural, onde o sentimento do trágico, perturbador, se afeiçoava à corrosão. O pendor ao arredondamento, característico das formações geológicas que Euclides dizia existir, aflorava em sua narrativa ou melhor, nas suas impressões e descrições da natureza. Sob uma função mais pragmática, a visualização dessa “terra amplíssima” aparecia um pouco para reequilibrar a revolta daquele relevo e para aliviar a solidão humana estampada naqueles restos de ruinarias. Ela apontava para o horizonte, dilatando a vista, fazendo com que os riços e os escombros não fossem notados por seu aspecto desolador. O olhar livre, engendrado e engendrador dela, dispensavam o segmento revolto do litoral, os limites do olhar apertados, eliminavam a proximidade ou a vista abreviada, e mergulhava no “âmago da terra amplíssima”, numa dilatação extensa que só era capaz de perceber o longínquo, o quadro estável do todo, o belo apenas.

Das três configurações de relevos ressaltadas por Euclides um traçado uniforme lhes é superior. Derivado de “formações geognósticas díspares”, ele é resultado do “predomínio exclusivo de umas, ou a combinação de todas”. Condensando as “estratificações discordantes”, a variabilidade dos traços a fim de determinar a “fisionomia da terra”, que não era senão o perfil do conjunto, neutralizador e domesticador, da força antagônica presente nas disparidades.

Contudo, não há melhor constatação do caráter intencional — que sobrepuja a neutralidade descritiva de um cientista como Euclides — do que a afirmação derradeira sobre as mudanças estruturais dos relevos: “Verifica-se, assim, a tendência para um aplainamento geral”, dizia Euclides Esta sentença parece explicitar o que de fato interessava no exame da natureza d’Os Sertões. Mesmo depois que ele adentrar no “sertão adusto” e experimentar intimamente os alinhamentos incorretos da natureza, vai precisar voltar à apreensão de uma tendência geral, porque, sendo esta estável e estabilizadora, somente ela propiciaria as condições do cognoscível, daquilo que é adequado à descrição. Quanto mais um terreno apresentava sinais de ruínas e de tormentos mais ele se tornava inóspito à sondagem do cientista e à neutralidade descritiva. No caso de Euclides, a imperfeição da terra torna vacilante o raciocínio do observador, ao passo que o horizonte invariável e uniforme verticaliza as idéias na mente do cientista, fazendo dele um realizador das lições práticas dos manuais da engenharia.

 

Para que possamos aprofundar nossa análise, será preciso nos concentrar nos aspectos de resistência oferecidos pelo cenário atormentado das paisagens dos sertões. Essa resistência, traduzida pelo “martírio da terra” — onde a vida se faz ruína e produz o velho já no nascimento —, será submetida à dupla associação. Ao tentarmos relacionar os vestígios com a idéia de resistência, procuramos sublinhar no caráter indicial do vestígio não só aquilo que “se impropriou à vida”, destruiu-se, portanto, mas aquilo que, por ter desaparecido, a incluiu. Assim, pelo desvelamento da função do vestígio seremos capazes de detectar duas de suas formas: o vestígio cristalizador da morte e o vestígio, ainda que resistente à vida, é fecundador.

A entrada do sertão é seguida pela abordagem de uma terra ignota. “Abordando-o, compreende-se que até hoje escasseiam sobre tão grande trato de território (...) notícias exatas ou pormenorizadas”. A princípio, a falta de descrição, que divulgaria a aparência daquele terreno, constitui um primeiro obstáculo para torná-lo penetrável, cognoscível, portanto. Depois, agregado a esse fator, “o rabisco de um rio problemático ou idealização de uma corda de serras” reafirma o antagonismo da região. Pronto, foi formada a clareira, o hiato, o “estranho território” que está predestinado “a atravessar absolutamente esquecido, os quatrocentos anos da nossa história”. “Paragem sinistra” evitada, ela era sempre contornada, pois não propiciava as condições de uma branda travessia. “No entanto quem se abalança a atravessá-la” surpreende-se com “verdadeiros oásis”. Parênteses no deserto, essa terra ignota faz surgir ou melhor faz submergir (para estender à reflexão de Luiz Costa Lima), via esforços raros de persistência, as tais “ilhas da subcena”, onde a condensação de imagens se dinamiza através do esforço de torná-las apreensíveis, criando um novo sentido para os “espectros”, os poucos sinais do ignoto[7].

À sombra do texto neutro e intencional de Euclides, iremos investir na caracterização dos vestígios para verificar como a neutralidade científica nele se dispersa e dá lugar, num leve escapar de imagens — sem nenhuma autorização por parte do autor —, a uma forma que se depura da própria condição estabelecida para o vestígio.

Não estamos querendo afirmar a permanência de um lugar espacialmente fora dos sertões que se chama terra ignota, e sim que, à margem do retórico e dramaticamente descrito, manifesta-se, da resistência à vida do vestígio-morte, uma flagrante possibilidade de existência para o vestígio-que-fecunda. O anfiteatro do sentimento trágico se perfila na “paragem impressionadora”:

 

“As condições estruturais da terra lá se vincularam à violência máxima dos agentes exteriores para o desenho de relevos estupendos. O regime torrencial dos climas excessivos, sobrevindo, de súbito, depois das insolações demoradas, e embatendo naqueles pendores, expôs há muito, arrebatando-lhes para longe todos os elementos degradados, as séries mais antigas daqueles últimos rebentos das montanhas: todas as variedades cristalinas, e os quartzitos ásperos, e os fílades e calcários revezando-se ou entrelaçando-se, repontando duramente a cada passo, mal cobertos por uma flora tolhiça — dispondo-se em cenários em que ressalta, predominante, o aspecto atormentado das paisagens.

“Porque o que estas denunciam — no enterroado do chão, no desmantelo dos cerros quase desnudos, no contorcido dos leitos secos dos ribeiros efêmeros, no constrito das gargantas e no quase convulsivo de uma flora decídua embaralhada em esgalhos — é de algum modo o martírio da terra, brutalmente golpeada pelos elementos variáveis, distribuídos por todas as modalidades climáticas”[8].

 

O cenário atormentado desta paisagem expressa a hostilidade da natureza. O ambiente hostil se contorceu tão violentamente que a variabilidade do clima, captada pelas lentes do cientista, só fez acentuar o aspecto de “martírio da terra”. Esta martirização é correlata ao tom dramático e ao sentido científico dados à narração. Em seu quadro, não é possível fugir à condenação de morte, porque o golpe brutal foi dado pela explicação científica, infalível para Euclides. A elaboração de uma imagem de “martírio da terra” é derradeira, porque é sustentada por moldura científica, pela causa que explica a variação climática, eliminando, de forma determinante, qualquer possibilidade de emersão do poético. Neste caso, o aspecto martirizante da terra deixou de constituir um impulso à imaginação poética quando foi enquadrado por explicação cientificamente respaldada. O aparato científico, portanto, garantiu menos desequilíbrio dos sinais de corrosão, porque ali a força vital da natureza foi mostrada no seu movimento natural de degradação e enfraquecimento, trazendo à tona a determinância de uma lei geral. Podemos afirmar com Costa Lima que a ciência torna-se desse modo mero trabalho extrativo e nunca um campo de exploração possível a partir do real.

Num resvalar quase imperceptível, notam-se algumas poucas violações das premonições de morte ditadas pelas lentes do cientista, perante cenário tão hostilizado. Essas violações são um manifesto contra aquelas, contra a beleza manifesta somente na aparência viva e a favor da vida interna congelada no vestígio. A idéia animista da ciência era surda ao quadro de vestígio, pois, segundo ela, nele sempre estava indiciado um movimento de destruição. No entanto, os “parênteses breves abertos na aridez geral”, as “lagoas mortas”, os “verdadeiros oásis” eram as provas de que o premeditado pela ciência se desencontrava do real. Num deslocamento cada vez mais distante, o esperado e o experimentado visual-sensorialmente caminhavam em direções díspares. Era, contudo, um agregado de imagens que se precipitava — numa trama violadora — do esquema estável da ciência.

Na mente linear de Euclides imperava a equação vida-beleza-harmonia-cognoscível, por isso ela não admitia possibilidade de apreciação estética na aparente falta de vida do vestígio. Daí seu necessário embaraço ao ter de expressar-se —  fora de seus parâmetros fixos do cognoscível — diante do ignoto. Onde o líquen, vestígio de local ainda não penetrado e explorado pela ciência, fecundava a terra de uma “região incipiente ainda (...) preparando-se para Vida”. Leiamos a parte onde se impõe a “impressão dolorosa” sobre Euclides quando ele tenta definir “aquele ignoto trecho do sertão”:

 

“Acredita-se que a região incipiente ainda está preparando-se para a Vida: o líquen ainda ataca a pedra, fecundando a terra. E lutando tenazmente com o flagelar do clima, uma flora de resistência rara por ali entretece a trama das raízes, obstando, em parte, que as torrentes arrebatem todos os princípios exsolvidos — acumulando-os pouco a pouco na conquista da paragem desolada cujos contornos suaviza — sem impedir, contudo, nos estios longos, as insolações inclementes e as águas selvagens, degradando o solo”.[9]

 

Neste quadro, a “flora de resistência rara” mostrava o inesperado para as lentes do cientista. Se antes elas adulteravam a realidade, tentando deter o germe de vida do vestígio, ali elas tinham de se desgarrar da estabilidade dos quadros pintados pela ciência e se atrelar, imageticamente, a uma “região incipiente” que sequer seus traçados tinham sido definidos.

 

 


 

[1] Lucia Ricotta é bolsista de docência e pesquisa PRODOC/CAPES ligada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Literatura, na Faculdade de Letras/UFRJ.

[2] CUNHA, EUCLIDES DA: (1902) Os Sertões. Rio de Janeiro: Ed. Nova Aguilar, 1995, p. 101.

 

[3]  Idem, ibidem.

[4] Com relação ao aspecto selvagem que Euclides identifica no homem, vejamos passagem em que ele tenta convencernos de como ele é capaz de fazer um deserto através de “selvatiquezas (que) atravessaram toda a nossa história”: “É que o mal é antigo. Colaborando com os elementos meteorológicos com o nordeste, com a sucção dos estratos, com as canículas, com a erosão eólia, com as tempestades subitâneas — o homem fez-se uma componente nefasta entre as forças daquele clima demolidor. Se o não criou, transmudou-o, agravando-o. Deu um auxiliar à degradação das tormentas, o machado do caatingueiro; um supletivo à insolação, a queimada.

 “Fez, talvez, o deserto. Mas pode extingui-lo ainda, corrigindo o passo. E a tarefa não é insuperável. Di-lo uma comparação histórica.” conf. Euclides da Cunha, Os Sertões Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1995, p. 140.

[5] Sobre os sinais da história como sinais de corrosão e, portanto, de uma história sem poder de regeneração e sim como “coleção de ruinarias” ver: (1996) HARDMAN, F. F. “Brutalidade Antiga: sobre história e ruína em Euclides”, Revista Estudos Avançados 26, São Paulo, p. 294.

[6] CUNHA, E., op. cit., p. 101.

[7] Luiz Costa Lima assinala a partir dos parâmetros de intencionalidade e não-intencionalidade autoral a passagem da imitação para a mimesis, nas configurações de imagem do ignoto: “Não se entenda que estejamos resgatar o que teria sido intencional a Euclides. Muito ao contrário, o acompanhamento detalhado de sua ‘travessia’ nos importa pelos indícios que propicia de uma não-intencionalidade, que se precipita nas ilhas da subcena. Neste momento, no interior dessas ilhas, a narrativa parece comandada por um centro ignorado.

Com isso tampouco estamos dizendo que a mão de Euclides se comportasse como de um autômato. Na verdade, o que aqui se esboça é a luta entre uma disposição científica e outra a que outro parâmetro modela. Tudo sucede como se a precipitação da diferença (...) se realizasse independente e por fora da consciência do analista-narrador (...) A passagem da imitação para a mimesis supõe o trabalho de intencionalidade e não-intencionalidade. Se a intencionalidade remete à consciência de um sujeito a mimesis então supõe a presença de um aquém-do-sujeito”. Conf. COSTA LIMA, L. (1996), “História e Literatura. Três momentos de sua relação”, mimeo.

p. 151.

[8] CUNHA,E. op., cit., p. 112.

[9] CUNHA, E. op. cit., p. 115.

 

 

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